Devido a origem embriológica do trato urinário, muitas são as malformações possíveis, algumas simples e frequentes e outras complexas e raras.
Com a realização rotineira de ultrassons gestacionais, o diagnóstico de malformações pré-natal virou rotina, sendo as do trato urinário e sistema nervoso central as mais frequentes. Segundo alguns autores 0,5% dos bebês recém-nascidos apresentavam indícios de malformação no ultrassom, sendo que destes bebês, 70% são confirmados com alguma malformação renal. A recomendação é que se realize um primeiro ultrassom para rastreio de anomalias do sistema urinário entre a 15ª e a 18ª semana gestacional e um segundo ultrassom entre 28ª a 30ª semana gestacional, sendo este segundo ultrassom mais sensível para diagnóstico de alterações no trato urinário.
As grandes vantagens do diagnóstico pré-natal são:
- Procurar um nefrologista infantil e/ou urologista pediátrico para orientações;
- Se preparar emocionalmente;
- Saber as possibilidades de tratamentos;
- Ter uma equipe de profissionais habilitados para receber o bebê e fazer seu seguimento;
- Se necessário, nos casos graves, intervenção cirúrgica no momento adequado (pré ou pós-natal).
As malformações mais frequentes do trato urinário são:
- Agenesia renal bilateral;
- Rim único;
- Ectopias renais / Rim “em ferradura”/ Rim “em bolo”;
- Estenose da junção ureteropiélica (JUP);
- Estenose da junção ureterovesical (JUV);
- Duplicidade ureteral;
- Ureteroceles;
- Ureteres ectópicos;
- Válvula de uretra posterior;
- Displasia renal multicística;
Abaixo temos um breve relato sobre cada malformação e seus pontos mais importantes:
Agenesia renal bilateral
A agenesia renal é a malformação mais grave do trato urinário. Nesta patologia, os rins não se desenvolvem. A origem é desconhecida, mas acredita-se que seja multifatorial.
Esta malformação pode ocorrer de forma isolada ou fazer parte de uma síndrome ou alteração genética.
A ausência dos rins e a consequente incapacidade de produzir urina fazem com que haja uma grande diminuição do volume do líquido de dentro da barriga da mãe, chamado líquido amniótico. A baixa produção do líquido amniótico resulta em diversas anomalias fetais caracterizadas por desenvolvimento inadequado do pulmão, um rosto típico e deformidades nos membros superiores e inferiores, estas alterações são chamadas de: “sequência de Potter”.
Outros sistemas que podem estar malformados associados a agenesia renal bilateral são – seguidos de sua frequência de aparecimento:
- Sistema cardiovascular – 14%
- Sistema musculoesquelético – 40%
- Sistema nervoso central – 19%
O diagnóstico desta malformação se faz através de ultrassom a partir da 14 semana de gestação quando o líquido amniótico passa a ter um papel importante no desenvolvimento fetal. As evidências ultrassonográficas para este diagnóstico durante o ultrassom são:
- Não visualização de ambos os rins;
- Bexiga sem urina dentro; e
- Baixíssima produção de líquido amniótico, conhecida como oligoâmnio.
Aproximadamente 31% dos fetos com agenesia renal bilateral acabam sendo abortados naturalmente e em 47% ocorre um retardo do crescimento intrauterino. Das crianças que conseguem nascer, 60% nascem prematuros. Esta doença é incompatível com a vida.
Rim único
Durante a gestação, um dos rins pode não ser formado. A agenesia renal unilateral ou rim único ocorre em uma frequência de 1:2900 nascimentos, mãe diabéticas e de raça negra tem maior probabilidade de terem filhos acometidos. Normalmente, estas crianças tem um número menor de néfrons (unidades funcionantes do rim) e, por isso, ocorre um fenômeno compensatório levando a uma hipertrofia do rim existente, isso faz com que este rim tenha um tamanho acima da média na maioria dos casos.
Ao saber que seu filho tem apenas um rim é necessário um acompanhamento com nefrologista infantil para investigar possíveis anormalidades de outros órgãos e tecidos e garantir uma boa função renal.
Ectopias renais / Rim “em ferradura”/ Rim “em bolo”
Muitas são as malformações onde o rim não se formou no local adequado. São elas:
- Ectopias renais, ou seja, rins fora do posicionamento correto dentro do organismo: Ocorre quando os rins após formados não migraram para o local adequado. Nas ectopias mais comuns ou os rins ficam ambos do mesmo lado (ectopia renal cruzada) ou permanecem na região pélvica. Os dois rins ou apenas um podem estar localizados de maneira errática.
- Rim “em ferradura”: rins, normalmente em região pélvica, unidos pelos polos inferiores.
- Rim “em bolo”: neste caso as células que formariam o rim se unem formando um único rim na região pélvica com dois sistemas coletores (por onde sai a urina para ir para a bexiga). Quando se palpa a barriga da uma impressão de tumor.
Devido ao mal posicionamento renal outras malformações podem estar associadas, são elas:
- Trajeto do ureter (tubo que leva a urina produzida no rim até a bexiga) anômalo provocando obstruções do fluxo urinário;
- Refluxo vesico-ureteral, ou seja, quando a urina da bexiga retorna ao rim;
- Alterações cardiovasculares;
- Alterações esqueléticas;
- Alterações gastrointestinais;
- Alterações ginecológicas.
O prognóstico costuma ser bom, principalmente se não houver associação com outras malformações.
Estenose da junção ureteropiélica (JUP)
A estenose da junção ureteropiélica, conhecida também no meio médico como estenose de JUP, ocorre quando há um estreitamento perto da saída renal do tubo que liga o rim a bexiga e tem a função de conduzir a urina, denominado ureter. Devido a este estreitamento, a urina produzida no rim não consegue ou demora para chegar na bexiga.
Esta malformação ocorre em 1:5000 nascidos vivos, é duas a três vezes mais comum no sexo masculino e 10 a 25% mais frequente do lado esquerdo. Pode ocorrer em um dos lados (75 a 90% das vezes) ou bilateralmente (10-25% dos casos).
O ultrassom é o primeiro exame necessário para iniciar a investigação. Durante a realização do ultrassom pré-gestacional ou pós-gestacional é possível avaliar um acúmulo de urina no rim, sugestionando que ocorre um impedimento ao fluxo urinário em alguma parte do trato urinário, para isso damos o nome de hidronefrose.
Após a realização da suspeita diagnóstica é necessário procurar um nefrologista infantil para avaliar se estas são alterações importantes com necessidade de intervenção cirúrgica para correção, ou se são alterações mais leves que poderão ser acompanhadas clinicamente.
Estenose da junção ureterovesical (JUV)
A estenose da junção ureterovesical, conhecida também no meio médico como estenose de JUV, ocorre quando há um estreitamento do ureter (tubo que liga o rim a bexiga e tem a função de conduzir a urina) perto da entrada da bexiga. Devido a este estreitamento, a urina produzida no rim não consegue ou demora para chegar na bexiga.
O ultrassom é o primeiro exame necessário para iniciar a investigação. Durante a realização do ultrassom pré-gestacional ou pós-gestacional é possível avaliar um acúmulo de urina no rim, sugestionando que ocorre um impedimento ao fluxo urinário em alguma parte do trato urinário, para isso damos o nome de hidronefrose. Além disso, durante a realização do ultrassom, as vezes é possível visualizar os ureteres que, em situações rotineiras, não deveria ser visualizado.
Após a realização da suspeita diagnóstica é necessário procurar um nefrologista infantil para avaliar se estas são alterações importantes com necessidade de intervenção cirúrgica para correção ou se são alterações mais leves que poderão ser acompanhadas clinicamente.
Duplicidade ureteral
A duplicidade ureteral ocorre quando há 2 ureteres para cada rim, ou seja 2 tubos coletores de urina no rim para levar para a bexiga. Esta duplicidade pode ocorrer em apenas um dos rins ou em ambos os rins, também existe a possibilidade desta duplicidade ser completa (cada ureter que sai do rim chega a bexiga) ou incompleta (saem dois ureteres do rim que se unem no meio do caminho para chegar a bexiga em um tubo único).
Esta patologia é geneticamente determinada, autossômica dominante, e ocorre em 0,1% da população.
A duplicidade incompleta normalmente é achado de exame sem repercussão clínica e não se constitui como doença, apenas variação da normalidade. Porém, em alguns casos, pode ocorrer obstrução do trato urinário, neste caso é necessário a avaliação de um urologista infantil.
A duplicidade completa pode ou não se constituir uma doença. Quando não ocorre retorno da urina da bexiga para o rim (refluxo vesico-ureteral) ou obstruções do trato urinário, é apenas uma variação da normalidade. Ocorrendo alguma alteração, o acompanhamento com nefrologista pediátrico e urologista infantil é necessário.
Ureteroceles
A ureterocele é uma dilatação congênita onde o ureter (tubo que leva urina do rim até a bexiga) parece um pequeno balão dentro da bexiga.
Sua frequência é maior em mulheres (7 mulheres para cada homem). Normalmente, é unilateral em 90% dos casos.
Pode ser uma malformação esporádica que, em geral, não causa sintomatologia. Porém, se realizado o diagnóstico, por poder levar a obstrução do fluxo urinário, deve ser corrigida cirurgicamente. Também, pode estar associada com duplicidade ureteral e, neste caso, pode levar a infecções urinárias intratáveis e grave obstrução do trato urinário, devendo sempre ser abordada cirurgicamente.
Ureteres ectópicos
Está malformação ocorre quando o ureter (tubo que leva urina do rim para a bexiga) se insere em um local incorreto. O ureter ectópico pode estar desembocando:
- Mal localizado na bexiga;
- Uretra (tubo que leva a urina da bexiga para o meio externo);
- Vulva ou vagina.
Nestes casos a avaliação de um urologista infantil se faz necessária para decidir se há necessidade de correção cirúrgica.
Válvula de uretra posterior
É uma doença grave que só ocorre em meninos, caracterizada por resquícios embrionários que formam uma membrana que impede que a urina saia da bexiga e vá para a uretra (canal que liga a bexiga com o meio externo).
Esta malformação pode ser muito grave, levando a insuficiência renal, ou leve, com prognóstico mais favorável.
Durante os ultrassons gestacionais no paciente com válvula de uretra posterior, a partir da 11ª semana gestacional, é possível avaliar alterações na bexiga do neném consequentes ao aumento de pressão dentro da bexiga que, por sua vez, ocorreu como resultado da obstrução do fluxo urinário. Secundariamente, podem aparecer alterações nos ureteres (tubo que leva urina do rim para a bexiga) com dilatação decorrente de um retorno da urina que está em alta pressão na bexiga para o rim; está dilatação pode ser unilateral ou bilateral. Por último, se o retorno da urina da bexiga para o rim (refluxo vesico-ureteral) for muito importante, haverá lesão renal resultando em diminuição do funcionamento deste órgão, doença conhecida como: insuficiência renal.
Ao se realizar o diagnóstico é fundamental o acompanhamento em conjunto com urologista e nefrologista infantil para decidir qual a melhor conduta a ser tomada e quando.
A abordagem cirúrgica intra-útero ainda é controversa e precisa ser avaliada caso a caso; enquanto, a abordagem cirúrgica após o nascimento se faz necessária o quanto antes, usualmente se utiliza uma técnica chamada ablação endoscópica. Até o momento da correção cirúrgica, a criança deve estar sondada (pequeno tubo inserido no pênis do bebê que chega até a bexiga) para esvaziar a bexiga e, com isso, diminuir a pressão no sistema urinário.
O nefrologista infantil conjuntamente com o urologista pediátrico vai avaliar a necessidade de medicamentos e a melhor conduta para cada caso com o objetivo de minimizar os danos renais e da bexiga.
Displasia renal multicística
A displasia renal multicística consiste em múltiplos cistos de vários tamanhos com perda da organização estrutural do rim. O rim displásico multicístico não tem função e, normalmente, é bastante grande.
Esta alteração, na grande maioria das vezes, ocorre em apenas um dos rins, quando ocorre bilateralmente é incompatível com a vida.
As crianças com esta patologia devem ser acompanhadas por um nefrologista pediátrico para investigação de outras malformações associadas tanto no rim não acometido como em outros órgãos como coração.
O prognóstico dependerá das outras anormalidades encontradas. Em geral, tem uma evolução extremamente favorável quando não há comprometimento do rim não afetado e outros órgãos e sistemas.
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